[vc_row][vc_column][vc_column_text]Vanessa Melo: Resistência e afetividade são as marcas da vendedora ambulante
“Boa tarde, querida. Qual número você quer?”, é assim que Vanessa Melo recebe seus clientes em sua banca de chinelos na Praça do Largo da Carioca (Centro/RJ). Com muita atitude e força, a vendedora saí às 7 horas da manhã de Miguel Couto, Nova Iguaçu, para estar no centro do Rio, às 10 horas e começar mais um dia trabalho. “Ando do Largo da Carioca para Central. Na Central do Brasil, eu pego um ônibus ou trem. Quando chego em Nova Iguaçu, entro em outro ônibus e vou andando para casa. Levo no carrinho à grade e os chinelos. Fico feliz da vida. O importante é estar trabalhando e levar o sustento para a família”, conta.
A história de Vanessa Melo é de longa data, em 2001, após se ver desempregada e com filhos para criar, decidiu ir para as ruas garantir uma renda no final do dia. No início de sua trajetória, os produtos que vendia eram variados: óculos, bijuterias e até bombons, sempre o que estava em evidência, “Já vendi de tudo. Hoje, só chinelo é muito cansativo. Porque é borracha e pesa”, diz. O dia a dia para quem trabalha nas ruas não é brincadeira. Historicamente, as/os camelôs e o poder público, infelizmente parecem estar sempre em conflito. Nisso, a repressão policial é uma realidade vivenciada diariamente por ambulantes que não possuem a licença do município para estar no local.
E não há qualquer desconto para as mulheres, mães e trabalhadoras que atuam na profissão. Dados de uma pesquisa realizada pelo Observatório da Metrópole – Projeto Morar, Trabalhar e Viver no Centro, em 2018, apontou que 27 mulheres entrevistadas afirmaram ter tido suas mercadorias apreendidas pela Guarda Municipal do Rio. Uma realidade com a qual Vanessa convive diariamente: “Em 2001, eu corria o dia inteiro dos guardas municipais que não deixavam trabalhar, então existia a guerra, os camelôs lutavam para continuar nas ruas. Hoje a repressão está menor, mas às vezes os guardas vem a mando da prefeitura. Agora está melhor estou conseguindo ficar uns dias sem ter medo de ser retirada”, conclui.
Com a crise financeira que assola todo o Estado, o desemprego em alta e o salário mínimo em baixa são os motivos que mantém a vendedora ambulante no ofício, mas sua família é o motivo principal. Mãe de 4 filhos e 2 netos a moça tímida e simpática carrega no seu celular a foto de seus pequenos buscando amenizar a rotina, “meus filhos reclamam bastante, ‘mãe, você não pára em casa?’. Ontem eu cheguei às 23 horas, levei as compras e fui dormir, e hoje às 7 horas da manhã eu já estava saindo de casa. Eu vejo eles, vou lá na cama e conto 1, 2, 3 e 4, mas eles nem me vêem.” conta Vanessa. “Quando estou no trabalho que eu falo com eles, envio mensagem para Lynda de 15 anos e já digo o que tem para fazer em casa mas eu quase não tenho momentos com meus filhos. Eu sinto muito falta deles, principalmente da minha neta Sophia de 3 anos. Ela quer vir trabalhar comigo, mas como vou trazer? Se tem uma corrida não tem como levar criança e mercadoria na hora. Seria bom se eu pudesse chegar mais cedo um pouquinho”, lamenta.
Acontecimentos inusitados envolvendo turistas estrangeiros também ocorrem na jornada de Vanessa, “sempre que os gringos aparecerem na minha banca eu não entendo nada – porque não falo inglês, só thank you (obrigada). Engraçado são eles (turistas) tentando falar as numerações dos calçados e acabam levando. Eu peço para experimentarem mas preferem levar o número pequeno. Eu concordo que está certo, importante é vender”, relata.
Em 2009, a CAMTRA produziu a pesquisa “A informalidade é formal”, na qual entrevistamos 201 trabalhadoras na cidade do Rio. A vulnerabilidade social, principalmente das trabalhadoras negras e mães, foi o ponto mais chamativo dos dados. Para Vanessa Melo, a opressão acontece também pela falta de diálogo entre a categoria das trabalhadoras/es ambulantes e os governantes. “Falta uma boa conversa. Não custa nada você deixar uma barraca na calçada, as pessoas passam para comprar. Os lojistas falam ‘quando os camelôs não estão por perto diminui o fluxo de pedestres’. Não tem essa população entrando no comércio local. Minha lógica é a seguinte: deixar um espaço para passagem e outro para venda. Será bom para todos os lados e ainda gera riqueza para o país”, finaliza.
Texto por Beatriz Carvalho, jornalista e fundadora do negócio social Mulheres De Frente.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row]